por MJ
Quando lia numa revista holandesa para pais e outros adultos que lidam com crianças e jovens, um artigo sobre a importância da natureza no crescimento das crianças, pensei na minha infância, na das minhas filhas e na das crianças e dos jovens na região de Lisboa, e quem sabe até noutras zonas urbanas em Portugal.
A minha infância e juventude foi passada nos anos 70 e 80 do século XX. Apesar de ter nascido e vivido em Lisboa, cresci em Sintra. Vivi numa casa com um grande quintal cheio de árvores de fruto e um grande jardim. Como não tinha irmãos com idades próximas à minha, nem primos por perto, brinquei a maior parte do tempo sozinha.
Mas isso nunca foi um problema para quem, como eu, tinha energia e criatividade de sobra. Pude brincar diariamente ao ar livre, subir às árvores, mexer na terra, nos bichinhos de conta e nas minhocas, ver os pirilampos à noite no verão, caçar grilos, colher e comer frutos das árvores, comer morangos cheios de terra, comer pinhões partidinhos na hora, fazer piqueniques, deitar-me debaixo de um grande pinheiro a ler ou simplesmente a olhar para o céu, …
Esfolei os joelhos vezes sem conta, brinquei em cima das árvores, brinquei lá fora até escurecer … Tudo isso no quintal e no jardim que pareciam gigantes aos meus olhos de criança. Para além disso, tive o privilégio de poder acompanhar o meu avô, por algum tempo, na sua pequena horta. Havia também pássaros, cães, gatos e coelhos.
Quanto às minhas filhas, que nasceram e cresceram em Amesterdão, também tiveram a possibilidade de conviver ao longo do seu crescimento com a natureza.
Apesar não viverem numa vivenda, como a cidade tem imensos parques, um grande bosque e a natureza à mão de ser usufruída e apreciada, aproveitou-se.
Por isso, desde que nasceram que se sentaram e deitaram na relva, meteram as mãos na terra e na areia, passaram muito tempo a brincar nos parques, passearam ao ar livre, nos bosques, nas dunas, pescaram girinos, tiveram uma mini horta delas, acamparam na natureza, comeram fruta apanhada na hora, caminharam por montes e vales, subiram a rochas e a montanhas, apanharam folhas secas e castanhas, entre muitas outras coisas.
Os pais tornaram-se muito preocupados com a segurança dos seus filhos e menos disponíveis. Por isso, querem-nos controlados e fechados…
Na Holanda ainda se consegue fazer estas coisas com as crianças, mesmo morando na cidade. É só preciso querer. E nas férias sempre incluímos passeios na natureza, não importa onde estivéssemos. Acampávamos, fazíamos caminhadas por trilhos de pastores, ouvia-se o silêncio no cimo da montanha, os chocalhos das cabrinhas que pastavam, o som do mar e das ondas a bater, … Algo que elas sempre apreciaram, até hoje.
Mas quando penso e vejo as crianças portuguesas das últimas décadas que cresceram e crescem em meios urbanos, questiono-me: Porque estão tão longe da Natureza? Crescem condicionadas às paredes dos ATL’s ou das suas casas rodeadas de tv’s, telemóveis, tablets e computadores, com acesso à internet e a redes sociais.
Os pais tornaram-se muito preocupados com a segurança dos seus filhos e menos disponíveis. Por isso, querem-nos controlados e fechados, apesar de lhes darem um acesso ao mundo de forma virtual, quase incontrolável.
Apenas uma pequena percentagem de pais leva os filhos a passear na Natureza e na maior parte das vezes isso é feito através de programas de entretenimento previamente elaborados pelos serviços educativos de zonas verdes protegidas. É alguma coisa, mas não chega.
O que é um facto é que a natureza está muito mais longe da vivência das crianças e dos jovens de hoje. E como tal será também mais difícil aprenderem, na prática, a lidar e a respeitar a natureza, ou a saberem plantarem uma planta ou até a fazerem uma pequena horta, mesmo que na varanda. Como ser saudável se estão a maior parte do tempo dentro de edifícios e em contacto com ecrãs?
Mas o que não mudou é que as crianças de hoje continuam a ter a necessidade de crescerem saudáveis, ao ar livre, e a poderem descobrir a natureza que os rodeia. Talvez até mais ainda do que antes.
Passear no bosque, na mata, no parque, no jardim, ir à praia no Inverno, … tudo isso é fundamental.
Rebolar na relva, subir às árvores, comer uma laranja ou uma maçã colhida na hora, pescar girinos no lago, brincar com paus, faz tudo parte de crescer, de ser criança e descobrir o mundo natural que a rodeia, ao vivo e a cores, e não só na televisão, na aula de estudo do meio, ou numa visita pedagógica.
Na natureza pode-se brincar horas a fio. (E já agora também é económico.)Há sempre alguma coisa nova para ver, para descobrir, para fazer. E uma coisa leva a outras, como por exemplo, chegar a casa e pesquisar sobre algum bichinho que viu no passeio, ou começar a fazer um herbário, ou como colecionar pedras e descobrir o que são, etc. Basicamente descobrir coisas e interesses novos.
As crianças são felizes quando podem brincar livremente, ao ar livre. Brincar na natureza é uma vivência e uma experiência que nunca mais irão esquecer. E quanto mais especial, regular e prazerosa a experiência ao ar livre for, maior a possibilidade de, mais tarde, quererem fazer o mesmo com os seus filhos.
Brincar na natureza estimula o crescimento, a motricidade, a fantasia e a curiosidade, mas as crianças não vão sozinhas. Por isso, vá com eles! Não as leve só às visitas organizadas para preencher o domingo à tarde. Vá com os seus filhos, autonomamente, passear e explorar a natureza. Vá junto com eles e deixe-se levar. Descontraia e (re)descubra o prazer de estar ao ar livre fora do ruído da cidade e ainda por cima, com os seus filhos. É uma oportunidade magnífica de utilizar os sentidos e de juntos irem à descoberta. É tempo de qualidade que passarão juntos. Aproxima os pais dos filhos e faz bem a ambos, pelo entusiasmo que provoca e pela proximidade que proporciona. E se se sujarem, qual o problema? Faz parte.
O importante é que se sintam em casa na Natureza.